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A Galeria Nara Roesler apresenta, a partir do dia 16 de junho, a exposição Cores, Palavras e Cruzes, de Karin Lambrecht. A artista gaúcha faz sua terceira individual na galeria e apresenta cerca de 30 obras, entre desenhos e pinturas, produzidas entre 2009 e 2012. “O conjunto de telas que Karin Lambrecht ora apresenta resulta de intenso trabalho com cores, dissonantes, às vezes, como em um acorde musical, impregnando sua pintura de colorações que lhe são próprias”, explica Gloria Ferreira, curadora da exposição.


Karin Lambrecht, que participou da icônica exposição Como vai você, geração 80, em 1984, trouxe novos rumos para a arte contemporânea, repensando a tela e a forma de pintar. Suas obras habitam um espaço entre pintura e escultura, dialogando com a arte povera, corrente artística que se desenvolveu durante as décadas de 60 e 70, na Itália. Durante toda sua carreira, o tempo é entendido como condição vital da arte, questão que chega ao ápice em 2008, na instalação 9 de agosto de 1949, dia e noite, Camus em Porto Alegre, que referenciava o filósofo existencialista. Seu trabalho, que faz parte de coleções importantes como a da Pinacoteca do Estado de SP e Instituto Itau Cultural, ganhou sala especial na 25ª Bienal, em 2002, e prêmios como o Açorianos de Artes Plásticas, destaque em pintura, em 2009. 

As obras apresentadas revelam preocupações estéticas e éticas voltadas para um possível poder curativo das cores. A ideia de cura está no centro do objeto Cruz elementar, em papel e madeira, de forma meio triangular, com textos manuscritos ou marcados por carimbos e cruzes. A esse trabalho, unem-se desenhos nos quais Karin Lambrecht molda papeis, dobraduras e recortes de modo artesanal, utilizando ainda pigmentos e materiais como gaze e isopor. Neles, a artista imagina um futuro distante, um mundo com muitas paisagens onde a natureza é absorvida pela harmonia cultural. É o caso de Something, que traz aldeias, com pequenas cabanas, que giram em torno de São Mateus e de Maria, testemunhas da Ressurreição e da Ascensão. Um dos desenhos traz a criação do mundo pendurada.

Abstratas, com formas geométricas e pinceladas expressionistas e largas, as telas são de diversos tamanhos Nas quatro grandes, feitas ao longo de vários meses, os pincéis parecem querer voar pela necessidade de expansão e transmitem sensação de liberdade. Nas pequenas, de processo mais rápido, mais sob seu controle, somam-se tinta, pastéis secos e carvão, com mudanças de tonalidades de uma para outra. Há algumas, de dimensões intermediárias, cujo tratamento pictórico remete igualmente à cor como matéria espiritualizada com suas polaridades e interações, garantindo a alta voltagem de sua pintura.

As tintas, confeccionadas pela própria artista, trazem pigmentos de várias origens que interagem com o cádmio verde, misturado, que vem juntar-se ao ultra marinho rosa; o azul-paris mais o cobalto-turquesa, mais cádmio vermelho; ou ainda o lápis-lazúli e cores terrosas. A artista também mudou palavras que aparecem em algumas obras. Palavras que às vezes se dissolvem sob as várias camadas de tinta ou se transmutam, como em “teia” para “veia”, tendo, contudo, sempre o T, evocando ainda uma vez a cruz, a morte, a cura, a doença.

A série 11 Legendas para Bergman, por sua vez, apropria-se de frases do depoimento intimista do cineasta, aos 88 anos, sobre sua vida, infância, casamentos, filmes e sobre Fårö, em A Ilha de Bergman. Sobre papel de seda, as legendas, compostas com letras recortadas, têm os Ts em papel de prata, o que, em alusão à cruz, remete ao mesmo pensamento melancólico: “Não houve um dia em minha vida em que não tivesse pensado na morte”, diz o diretor sueco, cuja história guarda traços da própria história familiar de Karin.