A Galeria Nara Roesler tem o prazer apresentar a primeira exposição de Cristina Canale em sua sede em Nova York, artista que faz parte de seu elenco desde 2003. Em Things and Beings, as 12 pinturas e 10 aquarelas reunidas, concebidas de 1990 a 2016, oferecem um panorama resumido da produção de uma das mais importantes pintoras contemporâneas brasileiras.
Egressa de uma emblemática geração no Brasil que retomou a pintura no início da década de 1980, Cristina Canale manteve-se ao longo de toda sua carreira coerente à sua essência de pintora, mesmo vivendo na Alemanha desde 1993, quando a força de outros suportes como instalação vídeo e fotos predominavam no ambiente artístico.
Estes trabalhos, indicadores de mais de duas décadas de produção, revelam o virtuosismo de uma pintura sublinhada por complexas composições, ora com planos inchados e variáveis espessuras de camadas de tinta, ora com soluções liquefeitas. Em suas telas e desenhos, narrativas aparentemente triviais, construídas a partir de particular figuração, estão sempre prestes a se dissolver em abstração.
Segundo a artista, alguns aspectos influenciaram a sua obra: a paisagem sinuosa e de grande profundidade do Rio de Janeiro, o convívio com as curvas modernistas de Oscar Niemeyer na cidade carioca, o contato com a natureza (paisagem tropical) e o confronto do geometrismo presente na arquitetura, na programação visual e na arte no Brasil, em especial no Rio de Janeiro. “Este coquetel de visualidade tem muito a ver com o meu trabalho, enquanto a minha presença na Alemanha se explica dentro do meu interesse pela tradição da pintura e no contexto de sua retoma na década de 80”, afirma Canale.
Com imagens reveladas, ou veladas, pois, como disse certa vez o crítico Tiago Mesquita, “as suas figuras parecem imagens encontradas nos movimentos das nuvens ou nos contornos das ondas deixadas a beira mar”, Canale encontra seu arsenal poético em cenas cotidianas, domésticas, compostas por pessoas, mulheres, bichos, coisas e natureza. Em Things and Beings (Ser e as coisas), ao trazer seu variado vocabulário pictórico, é possível perceber uma afetividade latente a percorrer a materialidade dos objetos, os pequenos gestos, as paisagens, os seres retratados, as atmosferas cênicas.
Conforme a crítica Luisa Duarte, passados trinta anos do início da trajetória da artista, essa tensão que visa desconstruir uma vontade de ordem e perenidade - ou melhor, escolhe habitar um espaço ‘entre’, que transita pela abstração, as linhas e a evocação de figuras, tudo isso em grandes manchas de cor - é vista em cada uma das obras de Things and Beings (Ser e as Coisas), doando uma coesão aguda para a exposição como um todo. “Suas casas são triângulos, as flores são linhas, um chapéu desmancha-se até tornar-se pura massa de cor, o cabelo torna-se círculos e cones. É assim, deixando que um vocabulário prosaico da vida comezinha apareça erigido sob formas abstratas que essas pinturas se infiltram na cesura entre Ser e coisa, entre o que é perene e o que é transitivo. Essa obra escolhe entrelaçar de maneira conflituosa, pois é justamente no curto-circuito que reside a sua potência, o que é do mundo, o que passa, o que é próximo e o que é pura abstração.”, completa a crítica brasileira