marina da glória, rio de janeiro, 13 - 17.9.2023

solo jaime lauriano

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A convite do curador Ademar Britto, o artista Jaime Lauriano apresenta um projeto concebido especialmente para o programa SOLO da ArtRio 2023. Em paralelo à exposição do artista em exibição no Museu de Arte do Rio – MAR, a apresentação reúne desdobramentos de pesquisas desenvolvidas pelo artista nos últimos anos, além de obras inéditas.


A poética de Jaime Lauriano revisita símbolos, imagens e mitos formadores do imaginário da sociedade brasileira, tensionando-os a partir de proposições críticas capazes de revelar como as estruturas coloniais do passado reverberam na necropolítica contemporânea. O artista aborda as formas de violência cotidiana que perpassam a história brasileira desde sua invasão pelos portugueses, centrando-se, com especial perversidade, em indivíduos racializados.


A apresentação inclui dois trabalhos inéditos da série Pedras Portuguesas, desenvolvida desde 2017, na qual o artista, porinscreve  os nomes de antigos portos de saída de pessoas escravizadas,  fundados por Portugal ao longo da costa africana, como Cachéu e Calabar. Amplamente empregadas em calçamentos no país ibérico e posteriormente sendo exportadas também para países lusófonos, as pedras portuguesas utilizadas desta forma pelo artista evidenciam a centralidade do tráfico de escravizados para a sedimentação da colonização. 


As pedras portuguesas também integram o trabalho Colonização #2. Dessa vez, no entanto, aparecem reproduzidas em latão fundido e depositadas sobre um alguidar ao lado de objetos da umbanda e do candomblé, manifestações típicas da espiritualidade afro-brasileira. Desse modo, um símbolo associado à colonização aparece transformado fundido à uma tradição  de matriz africana, um tropos  de resistência e potência dos descendentes da diáspora africana no Brasil.


A obra inédita Primeira Missa, Primeiro Índio Abatido (2023) é um desdobramento de uma série recente em que o artista, ao lado de seus assistentes Nina Horikawa e Pablo Vieira, cria releituras de grandes pinturas históricas dos séculos XIX e XX, de caráter acadêmico e oficialesco, que representam e idealizam fatos da História do Brasil.  A pintura em questão, é uma releitura de A Primeira Missa no Brasil, pintada por Victor Meirelles em 1861. Seu propósito original era o de criar uma imagem oficial do evento, originalmente ocorrido no Século XVI, e que acabou escolhido como ato fundacional do país. Jaime Lauriano, contudo, altera propositalmente a cena, a começar pelo título, que extrai da letra de “Toda Menina Baiana”, música de Gilberto Gil. Suas alterações buscam remover o caráter fortemente idealizado da cena e acrescentar outros elementos, muitos deles contemporâneos, de forma a mostrar os problemas e implicações causados por esse episódio histórico, muitos deles vigentes até o presente. 


Na série também inédita Nunca foi sorte, sempre foi Exu, concebida especialmente para o programa SOLO da feira, Lauriano, que ao longo de sua trajetória ficou conhecido por trabalhar  com imagens amplamente familiares à sociedade, se serve pela primeira vez de elementos de natureza autobiográfica. O ponto de partida dessa sequência é um conjunto de fotografias produzidas pelo avô do artista na segunda metade da década de 1980, quando o mesmo  registrava o cotidiano familiar, em especial a profissão de sua esposa, avó de Lauriano, que era boleira e assim, se encarregava de preparar os bolos de aniversário para todas as crianças da vizinhança, incluindo do próprio neto.  


A partir dessas fotografias, Jaime elabora uma série de desenhos feitos com pemba – giz usado em terreiros de umbanda – sobre esses momentos referentes a sua infância denotando uma espécie de ritual de memória pessoal-coletiva Nas palavras da artista: “me chamou a atenção um bolo que ela fez para um de meus aniversários e que trazia um retrato meu desenhado. Algo simples, mas que hoje poderia ser lido como uma manifestação artística decolonial”.


A obra evidencia uma das facetas mais perversas do racismo, que é o fato de vitimar incontáveis criancas e jovens negros. No caso da cidade do Rio de Janeiro, onde o trabalho será mostrado pela primeira vez, têm sido frequentes os assassinatos e massacres de crianças negras por parte das polícias militares. Assim, pensar em infâncias negras é o que motiva essa nova série.