Nara Roesler São Paulo tem o prazer de apresentar Verônica, terceira individual de Daniel Senise na galeria. Com curadoria de Luis Pérez-Oramas, a exposição apresenta os mais recentes desdobramentos da série Museus e galerias, além de um conjunto de trabalhos inéditos que refletem sobre as relações entre espaço, tempo, imagem e memória. A exposiçãoabre ao público no dia 20 de agosto e fica em exibição até 1 de outubro de 2022.
A relíquia cristã onde se acredita estar registrada a verdadeira face de Cristo, conhecida como Manto de Verônica, teria sido o tecido usado por Verônica para enxugar a face de Jesus a caminho da crucificação, ficando marcado com os relevos de sua face. Este objeto serviu de inspiração para diversos pintores ao longo da história da arte. Representações, de artistas como El Greco e Zurbarán, servem de mote para a série Verônica (2022), apresentada pela primeira vez por Senise nesta exposição. O artista se apropria dessas composições, recriando-as, mas sem incluir o rosto de Cristo, de modo que o foco seja no suporte que dá sustentação para aquela imagem.
A série parece sintetizar, em tema e método, muito do processo que o artista vem desenvolvendo ao longo dos anos. Para realizar os trabalhos que compõem Verônica, Senise faz uso de uma das técnicas fundamentais de sua prática: a monotipia de superfícies. Utilizando uma mistura de água e cola que é espalhada sobre o espaço, o artista consegue, com um tecido, imprimir suas marcas, obtendo superfícies estampadas com as cores e indícios do lugar. O procedimento remete ao gesto da santa cristã que reteve em seu véu aquilo que seria a única imagem concreta do divino, feita em contato com seu próprio corpo.
Ao longo dos anos, Senise acumulou diversos tecidos obtidos com esta técnica. Inicialmente, ele a praticava sobre os pisos dos espaços, mas recentemente, tem realizado o procedimento em paredes. Destes tecidos, em especial, o artista extrai as superfícies que compõem a série Museus e galerias, iniciada em 2000. Ao utilizar as marcas de outros espaços para criar uma representação realista, o artista sobrepõe diferentes lugares, cada qual já portando indícios de seu uso, ou seja de sua própria história, para criar um trabalho que traz em seu corpo e em sua materialidade uma complexa relação entre os espaços e seus tempos.
As imagens feitas por Senise focam tanto nas estruturas arquitetônicas desses edifícios, esvaziando-o de público e obras – como o corredor espiralado do Guggenheim, em Nova York, as rampas da Fundação Bienal, em São Paulo, e as escadarias do Louvre, em Paris – como no ambiente interno dessas instituições, em que Senise recria os espaços dos quadros e suas molduras, como nas obras a partir do Museu Nacional do Prado e do Dia Beacon.
Estes trabalhos dialogam com o segundo momento da série Museus e galerias, que o artista havia interrompido em 2005, para então retomar quase uma década depois. Desde 2014, Senise tem desenvolvido representações de galerias repletas de obras, as quais, por sua vez, não vemos. A atmosfera etérea de muitos desses espaços se dá pelas características do material. As monotipias de parede, em sua maioria brancas, parecem dotar a composição de uma luminosidade que parece dissolver as formas, não fosse a inegável materialidade de suas marcas.
O terceiro grupo de trabalhos que compõem a exposição parte de um conjunto de negativos da coleção do Museu do Louvre, em Paris. Estes pequenos slides eram parte de uma publicação antiga do museu, que Senise guardava há anos. A umidade e o tempo acabaram por criar diversas manchas e marcas sobre essas imagens, criando apagamentos e distorções, que muitas vezes parecem intencionais. Senise escaneou as imagens dessas obras, entre as quais encontram-se Rembrandt, Jacques-Louis David, Domenico Ghirlandaio e Albrecht Durer, e as apresenta impressas em vinil diretamente aplicados sobre a parede, quase como se emergissem desta, evidenciando um duplo deslocamento: espacial, na escala das imagens e do lugar ao qual pertencem – no caso, o Museu do Louvre –, para aquele aonde são expostas; e temporal, pelas marcas das intervenções do próprio tempo que elas carregam em si.