são paulo 19.8 - 21.10.2023

cristina canale memento vivere,

Cristina Canale

Nuvens e retrato, 2023
tinta acrílica, tinta à óleo, spray acrílico, e colagem de tecidos sobre linho
200 x 175cm

sobre

Nara Roesler São Paulo apresenta Memento Vivere, sexta individual de Cristina Canale na sede paulista da galeria, que reúne uma seleção de suas obras mais recentes, produzidas entre os anos de 2021 e 2023. Com texto de Marcelo Campos, a mostra reúne uma seleção de cerca de treze pinturas e seis desenhos, todos inéditos, produzidos entre os anos de 2021 e 2023.


Canale despontou no cenário artístico brasileiro durante a década de 1980, período em que ocorria uma retomada da pintura no Brasil e no contexto internacional, com grande influência do neoexpressionismo alemão, e integrou a emblemática exposição coletiva Como vai você, Geração 80?, sediada na Escola de Artes Visuais do Parque Lage (EAV Parque Lage), no Rio de Janeiro, em 1984, que reuniu muitos nomes daquela geração de artistas.


Desde então, Canale tem produzido uma consistente obra pictórica, que se aprofunda  em gêneros de pintura já consagrados, como o retrato e a paisagem, valendo-se também de elementos e cenas cotidianas, muitas vezes derivadas de fotografias publicitárias, em composições marcadas por um colorido intenso, uma profusão de formas ambíguas e cenas de caráter onírico. 


A espinha dorsal da presente exposição consiste em um conjunto de pinturas de retratos que tem como objeto figuras femininas. Para a realização das mesmas, a artista revisitou não somente a história desse gênero pictórico, mas também elementos mitológicos. Conforme Canale relembra, a função primacial do retrato é a de eternizar rostos e presenças, os chamados mementos. Assim, em alguns dos trabalhos, a artista parte de figuras mitológicas, como o da Deusa Tétis e o da Princesa Danae, que tratam justamente da figura feminina como fonte de fertilidade e de vida. Em outros casos, utiliza um procedimento comum ao longo da história da retratística, empregado desde o Renascimento, que é da figura espelhada ou duplicada, como é o caso de Sincronias (2022) e Mãe e filha II (2023). 


Como é comum em sua trajetória, a artista remove de suas personagens as feições, resumindo seus rostos a traços essenciais, e emprega nas composições elementos amplamente presentes em sua poética, como balões de diálogo, nuvens, gotas e elementos atmosféricos, o que acaba por tensionar o limite entre gêneros pictóricos ao misturar paisagem e retrato, bem como a diferenciação entre figuração e abstração. Tais procedimentos terminam por criar, nas palavras de Canale, um “anti-retrato”, no qual a mesma acaba por “dissolver a situação retratal”. 


 O emprego de elementos bidimensionais por meio de colagens, já presente na poética da artista, aparece nos trabalhos desta mostra não somente nas pinturas, mas também em um conjunto de desenhos realizados sobre papel. Nesses trabalhos, Canale emprega alguns papéis coloridos e ricamente estampados, tradicionalmente empregados na embalagem de presentes, cujo colorido e as estampas dialogam com sua obra.

 

 Assim, mesmo naqueles trabalhos que não são retratos, o elemento feminino, ligado à  ideia de pulsão e de vida, aparece direta ou indiretamente. Se o retrato, ao longo de sua história, serviu como uma espécie de memento mori, os anti-retratos de Canale acabam sendo seu oposto: memento vivere.