Jose Dávila

Diário pessoal, 2023

metal, madeira, pedregulho, gesso, concreto, pá, vidro e tijolos
262 x 325 x 25 cm

sobre

A Nara Roesler tem o prazer de apresentar Um pirata, um poeta, um peão e um rei [A pirate, a poet, a pawn and a king], primeira exposição individual do artista mexicano Jose Dávila (Guadalajara, 1974) no Brasil. Marcando o início da representação do artista pela galeria, a mostra reúne trabalhos recentes de Dávila, com cerca de 20 obras, incluindo instalações, esculturas, pinturas e desenhos. Acompanhada de texto de Julieta González, exposição revela aspectos intrínsecos da prática do artista, marcada por uma abordagem da linguagem e da tradição escultórica a partir de uma perspectiva centrada na articulação entre a "vontade construtiva" e os princípios físicos que regem a natureza. 

 

O título da exposição faz alusão à ideia de transformação e mutação presentes na obra de Dávila e se refere ao modo como ele lida com os materiais, a partir de uma abordagem poética de uma música de Frank Sinatra (That's Life). Segundo a afirmação do artista: "Uma pessoa pode ser um pirata, depois um poeta, também um peão e acabar sendo um rei... a mesma pessoa. [...] Estou muito interessado na noção de que todas as coisas evoluem e se transmutam com o tempo: nós como pessoas, as coisas como objetos e materiais, o significado simbólico. Essa evolução constante é um campo fértil para o surgimento de novos significados, para que as mudanças sejam aceitas e para que novos começos aconteçam. Essa é uma qualidade e característica essencial da natureza da arte, a capacidade de transformação", pontua Dávila

 

Embora o elemento central de sua poética seja o campo escultórico, não lhe interessam a estabilidade e o caráter muitas vezes “sólido” desse tipo de linguagem, sua atenção se dirige muito mais à impermanência e a instabilidade. "A maneira como abordo os materiais, por que os escolho e como os utilizo posteriormente, está relacionada a esses conceitos, sintetizados no título da exposição, a partir de uma abordagem poética”, completa o artista. Isso fica visível em alguns trabalhos como Esforço Compartilhado, no qual Dávila, por meio de uma alça de catraca, une dois espelhos unilaterais de maneira oblíqua. O material responsável por puxar a alça para baixo e impedir que os espelhos caiam é um conjunto de pedras. Desse modo, o artista cria uma composição por meio de materiais completamente distintos e mesmo opostos, o que confere para a mesma uma latente sensação de fragilidade e colapso iminente. O esforço dividido em cada parte, no entanto, é o que mantém os elementos unidos. Princípio semelhante se dá no trabalho Cadeia Trófica, cujo título remete ao processo de transferência de matéria e energia dentro de um ecossistema. Nesse conjunto, um espelho se mantém elevado de forma oblíqua e imponente, às custas da disposição de um bloco de concreto e um conjunto de pedras. 

 

O olhar apurado para o espaço e para a análise das forças físicas, tais como massa, equilíbrio e materialidade, se faz constantemente presente no trabalho de Dávila. Os elementos de sua poética são explorados por meio dos mais diversos suportes e linguagens, indo desde a escultura e a instalação, nas quais emprega materiais rígidos como pedras, vidro e concreto até materiais flexíveis como arame, papelão e fitas e correias, até elementos pictóricos.  Um procedimento recorrente em seu trabalho são as releituras que executa das produções de figuras consagradas da História da Arte, como Donald Judd e Roy Lichtenstein. Na exposição, poderão ser vistos trabalhos da série Homage to Square, na qual Dávila transforma a série de pinturas homônima de Josef Albers em móbiles cinéticos.


A pintura também entra no radar poético do artista, igualmente embasada na busca por situações impermanentes ou tensionadas. Na série The fact of constantly returning to the same point or situation, Dávila cria um conjunto de círculos com cores e consistências distintas. Quase sempre incompletos, ou enquadrados de maneira a não se poder percebê-los como um todo, eles acabam provocando no espectador a mesma sensação, que é a de incompletude e desorientação. Orden Discontinuo, série de impressões realizadas em diferentes tipos de papel, trazem composições e provocam sensações similares, porém, incorporando também as qualidades dos suportes em que se inserem, como dobras/rasgos e texturas.