carlito carvalhosa 1961 – 2021

14.5.2021

É com grande tristeza que a Nara Roesler despede-se do artista Carlito Carvalhosa (1961-2021), que deixa uma obra imensa e significativa. Carvalhosa nasceu em 1961, em São Paulo. No começo dos anos 1980, assumiu, junto aos seus colegas do Grupo Casa 7, a grandiosa tarefa de dar prosseguimento a mais uma renovação da pintura como gênero. Coube a esta geração reinventar a possibilidade da arte depois do sublime esgotamento ao qual a geração anterior a conduziu. Carvalhosa atribuiu profunda eloquência à materialidade do suporte, mas pode transcendê-la e abordar questões mais amplas, relativas às transformações do espaço e do tempo.

 

A obra de Carlito envolveu pintura, escultura, instalação e performance. Deparamo-nos, em sua prática, com tensões entre forma e matéria, explicitadas em diálogos entre o visível, o sutil, o tátil. Nos anos 1990, dedicou-se à produção de esculturas de aparência orgânica e maleável, utilizando materiais diversos, como é o caso das ceras perdidas. Sua prática se expande nos anos 2000, ocupando o espaço com instalações que dialogam profundamente com a arquitetura, a paisagem e a história dos lugares em que se encontravam. O som também foi um elemento central em suas investigações, em colaborações com músicos como Philip Glass e Arto Lindsay, ou em performances como rio, de 2014, na qual Carlito criava uma cacofonia a partir do texto Meu doce rio, de Lygia Clark.

“Sua obra nos indica que ele soube encarnar o grande legado da modernidade carioca, aquele de Oiticica, Clark, Pape e Pedrosa, trazendo-o para o século XXI. Em sua obra, o mistério da afetividade das formas adquiriu uma dimensão monumental, um território sem precedentes, um inesgotável campo ampliado. Em outras palavras, coube a ele – e esta é uma das chaves de seu legado – criar um encontro entre a lição da não-arte à vida infinita da arte, de modo a re-inaugurá-la” -em palavras de Luis Pérez Oramas.

Pudemos testemunhar a força de sua potência criativa em exposições icônicas como A Soma dos Dias, no MoMA em Nova York (2011) e na Pinacoteca do Estado de São Paulo (2010); Sala de espera, no Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo (2013) e Já Estava Assim Quando eu Cheguei no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (2006). A arte Brasileira perde uma figura fundamental do período entre séculos, mas o mundo ganha um legado artístico incomensurável que é nossa responsabilidade manter vivo, seguir interpretando e colocar no patamar internacional que ele merece.

 

“Carlito não era apenas um artista extraordinário, mas uma pessoa extraordinária. Começamos nossa relação através de seu trabalho, sempre inquieto, experimental e enigmático. Rapidamente nos tornamos amigos, e tornei-me amiga de Mari, sua adorável esposa, e de suas filhas encantadoras. Ao mesmo tempo fui descobrindo o quanto ele era querido por seus colegas que, como eu, amavam seu modo doce e generoso. Carlito, diziam brincando, tratava a todos com a elegância de um alto funcionário do corpo diplomático. Quanto a mim, achava-o um príncipe. Nesses dias tão tristes, com sua partida ele fará uma falta danada. Mas sua obra ficará, resistirá ao tempo, e com ela um bocado da sua luz e do seu sorriso largo, bonito, seu olhar carinhoso, sua palavra calma e amável.” – Nara Roesler