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Dentro é uma montagem virtual de obras díspares, reunidas sob o denominador comum do interior. A imagem emblema desta seleção é um gesto monumental e poético de Carlito Carvalhosa: Já estava assim quando eu cheguei (2006). Nesta instalação, um molde do famoso Pão de Açúcar carioca, tantas vezes pintado pelos pintores viajantes desde o século XIX até o século XX, entra no interior do museu como uma imagem espelhada, invertida e dissecada.

Cada uma das obras nesta mostra virtual assinala um interior, refere-se a uma atividade, ou a um estado de interioridade: um lugar-abrigo com vista para o exterior (Lucia Koch); uma bolha que viaja por dentro de si mesma (Cao Guimarães e Rivane Neuenschwander); uma lâmpada de música (Cao Guimarães); um concerto de piano para ninguém que um gato-esfinge escuta (Cristina Canale); um jogo de sombras, em que a sombra da artista aterrissa como um pouso sobre o tradicional papel de parede da sala de um teatro (Brigida Baltar); um corpo protegido por um escudo, emparedado detrás de um fragmento arquitetônico (Alexandre Arrechea); a vista de um enorme museu sem visitantes onde os quadros são janelas escuras (Daniel Senise); o que resta de uma perspectiva renascentista quando se apagam dali as figuras (Fabio Miguez); uma casa – nosso lugar suspenso (Raul Mourão); o retrato de uma mulher guerrilheira, que luta por moradia, em seu recinto provisório, rodeada pelas suas plantas, que nos olha intensamente (Virgínia de Medeiros).

Como a primeira seleção curatorial virtual da Galeria Nara Roesler, disponível pela viewing room no Artsy e no site da galeria, Dentro busca capitalizar o espaço virtual ao juntar obras disponíveis para venda, ou que já estão em coleções, com a condição de que todas integrem um mesmo conceito, uma palavra, uma chave conceitual, reduzindo assim a curadoria a um gesto seletivo mínimo, à construção de uma série única. Nessa serialidade linear simples, cada obra contém uma intensidade diferente, e todas compartilham uma intensidade comum – neste caso, aquela do interior. Com o efeito da proximidade, cada uma se transforma e se faz eco, ou ressoa nas obras que a precedem ou sucedem.

Nisto, Dentro segue ao pé da letra o conceito de transformação em série: toda obra, como toda máscara – sugeria o antropólogo Claude Lévi-Strauss – supõe outra ao lado, real ou virtual, que a transforma em algo diferente. Minima moralia da curadoria: em uma franja todas as obras que, por aproximação, se transformam e se lêem em sucessão, como um Haiku, como um poema breve, em quarentena.

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